julho 30, 2005

4. Era um Escritor Famoso e Helena, de Joaninha




Um escritor famoso é um ser humano como qualquer outro. Vive paredes-meias com qualquer outro ser e tem as suas emoções, frustrações, depressões, ansiedades e no seu dia a dia expressa-se como qualquer um, por isso e por razões de burocracias, também próprias dos humanos, voltei à terra natal, depois de umas décadas de ausência. Era necessário fazer umas remodelações na casa que fora de meus pais e onde passei a minha vida desde que nasci, até à primeira fase da adolescência. Depois fui para a cidade para continuar a estudar, deixando um caixote cheio de recordações, a quem via partir “o menino simpático”, como era conhecido lá na rua.

Ao chegar, era inevitável que percorresse as ruas que sempre aconchegaram a garoto que fui. Era imprescindível que calcorreasse essas ruas, falando com cada pedra da calçada e sobretudo, trocando palavras, ou melhor, formulando uma perguntitas, que me martelavam a ideia.

Um sem número de episódios foram marcando esta vida de quem faz vida escrevendo. Alguns do episódios já gravados em alguns livros que foram sendo publicados depois do meu “boom” literário, outros, ainda em folhas soltas e numeradas vão-se mantendo nas prateleiras da estante, ao lado da mesa de trabalho.

Alguns nomes foram adoptados (pseudónimos, heterónimos, alcunhas, enfim…), para relatar histórias que foram sendo capítulos de entre as décadas desta vida que já vai longa desde que deixei de calcorrear as ruas da minha terra, ainda tão criança… Histórias umas vezes apenas histórias, outras com misturas de tragédias, como fora a vivida com Mariazinha…

Passei pelo parque. Agora muito melhorado em relação ao tempo que lá baloiçava ao lado de Helena, numa cadência de encantamento e inocência, que se foi perdendo década a década…

Um ventinho ameno soprava ao meio da manhã e o baloiço oscilava, como naquele tempo… uma vontade enorme de me sentar naquele baloiço, apenas foi reprimida pelo meu actual tamanho, mas oscilei com ele, imaginando-me ainda tão pequeno…

Helena! Tantas luas se escoaram pelo mar dentro, enquanto as ondas iam e vinham espreguiçar-se na praia… A distância que nos separava não era muita, mas tínhamos toda uma vida a distanciar-nos…

Na nossa aldeia apenas podíamos chegar aos seis primeiros anos de escolaridade, por isso, antes de fazer os treze anos segui para a cidade, para casa de um tio padre, que foi controlando o que eu ia estudando, mudando de ano até ingressar na Universidade, na Faculdade de Sociologia, que me proporcionou o curso dos meus sonhos, para poder viver ensinando e escrevendo. Escrevendo sobre a vida e os que a vão vivendo.

Mas olhando em volta, confiro os recantos conhecidos e vejo que continuam a sobreviver na ponta sul do parque, as duas únicas árvores do tempo em que eu e a Helena estávamos na mesma escola e que nos deram guarida quando sujei tudo de leite, depois daquele pontapé no pacote que não estava vazio… Ao lado, ficava aquele baloiço que nos deixou baloiçar, horas a fio, entre conversas angelicais, mas carregadas de profundo significado.

Helena! Onde estás Helena? Como pude deixar-te tão triste quando parti… e quando quis saber de ti, tarde demais! Partiras para França, para os teus estudos de pintura.

Hoje, quero que cada pedra da calçada me diga quantas vezes por aqui passaste, quantas vezes voltaste. Esqueceste-me? Juro que entre tantas controvérsias nunca me saíste do pensamento, mas sempre se criaram barreiras e fui adiando o querer voltar e estar contigo...

Helena, vou gritar ante estas duas árvores, que nos conheceram enquanto crianças, para que sejam testemunhas do tanto que sempre te amei. Amo-te! e amar-te-ei para o resto da minha vida.

Voltei a sentar-me no banco, que já não era o tosco tronco que fazia de assento, mas agora, um verdadeiro banco de jardim, e deixei que uma lágrimas de saudade bailassem e escorregassem, cara abaixo, enquanto ia murmurando o nome que continuava a ser a inspiração da minha vida…Helena…Helena…

Joaninha

3. O homem que estava sempre a olhar para o mesmo.para nada.Em Marraquexe, de Mendes Ferreira

todas as manhãs abria a janela.estreita.como um lírio.só um braço cabia naquela fresta.um braço e os olhos.tristes.inquisidores.calmos.à espera de nada.à espera de uma coisa que era sempre o mesmo. o inesperado.o insólito.o desejo de um silêncio impartilhável.secreto.adoçado pelo chá de menta e pela temperatura acima dos quarenta graus.os olhos tardavam na cúpula das palmeiras esgalgadas como cabras famintas em busca de um verde inexistente.um gato. sempre o mesmo.vigiava aquela fresta onde quase sempre a ponta de um cigarro marcava o andamento das horas. que nunca mudavam. e no céu sem núvens o deserto espraiava-se em ondas rosadas e suaves. pela tarde o rumor dos pássaros adormecia o homem à espera de nada. as pedras rolavam na planície de lama seca por séculos de seca.
Irmira levantou a mesa. em silêncio.só.
com passos de areia. entrou no quarto forrado a laranjas.quadrado.pequeno.o céu estremeceu.um relâmpago.devagar despiu o vestido negro profundo.outro relâmpago.Alá estava
zangado.
Irmira deitou-se.a noite estava quente.como sempre. cheia de nada. cheia de um silêncio amargo. enorme como o deserto. e chamou por ele.pelo homem que espreitava o mesmo
em cada olhar de tesoura.inquisidor.macio.agora manso.agora mais perto do oásis. Hassan fechou a pequeníssima janela. não fosse Alá indiscreto e viesse intrometer-se no seu enorme nada.procurou Irmina.atravessou com ela grutas e desfiladeiros.beijos e nespereiras.facas e colares de prata.anéis de neve. dobrou o Atlas e adormeceu.finalmente. esmagado pela magnífica e serena incompreensão dos sinais rosados que desaguavam no rio. o mesmo rio que levava a lugar nenhum.
Irmira dormia.nua.magra. morena.acetinada.cobra obediente. Hassan acendeu um cigarro. o gato espreguiçou-se.e outra vez o mesmo olhar.o mesmo impenetrável silêncio.e sempre o cheiro
das laranjeiras .

............................................algures no deserto..............................................

Mendes Ferreira
Piano

julho 29, 2005

2. O Sorriso, de Didas

"Preciso de me lembrar das nossas tardes no baloiço do parque, do meu vestido vermelho de pintas brancas a esvoaçar e das nuvens lá em cima que se afastavam e aproximavam em movimentos sucessivos. Dos risos que a vertigem me provocava. De ti ao meu lado, silencioso, sorridente e feliz.
Preciso de me lembrar dos recados em forma de poema que me escrevias nas aulas. Ainda os tenho todos, mas é só na memória que os guardo sem pó. Também tenho todos os teus livros, alinhados na estante e todos os dias os abro para que eles não se desabituem de ser manuseados. Tu sempre me disseste que os livros têm que ser manuseados, que não podem ficar só para ali, perdidos na estante.
Preciso de me lembrar do teu sorriso. É importante não esquecer o teu sorriso.
Preciso de me lembrar do dia em que comprámos a nossa primeira mobília a prestações porque não tínhamos dinheiro para a pagar de uma vez, mas estávamos tão felizes! Era a mobília mais cara da loja e nós comprámo-la mesmo sem termos dinheiro. Lembro-me que me disseste - “Agora somos ricos” – e eu ri muito e estava nervosa porque não sabia como íamos pagar aquilo, mas estava feliz. Nesse dia tinha o meu vestido azul, que era novo, e tinha apanhado o cabelo com um elástico.
Preciso de me lembrar da boneca que me ofereceste no meu aniversário. Era exactamente meia-noite quando a tiraste do armário, toda amarrotada porque estava escondida debaixo das malas. Eu estava sentada no sofá e já tinha vestido a camisa de noite, era cor-de-rosa e tinha uma renda branca. Tinha calçadas aquelas meias grossas a que tu achavas sempre piada porque vestia uma camisa de algodão e meias grossas de lã. Ficava mal, eu sei. Mas eu tinha sempre os pés tão frios! Ainda hoje tenho! Compraste a boneca porque achaste que era parecida comigo e eu achei que não, mas não me importei, por causa do teu sorriso.
Preciso de me lembrar do dia em que me pediste para ficar contigo para sempre. Lembro-me de todas as palavras que trocámos e da ordem exacta delas. Lembro-me do teu sorriso. Lembro-me que estávamos sentados num banco do jardim e passou uma criança de mão dada com a mãe. Calámo-nos um bocadinho enquanto eles passavam, para que não nos ouvissem. Só depois é que te disse que sim. E tu sorriste.
.............................................................
Preferia não me lembrar do dia em que te despediste de mim depois do almoço. Mas lembro. Com todos os pormenores que ainda hoje me fazem doer o peito por dentro. O médico diz que é sistema nervoso. Lembro-me que almoçámos peixe e eu me esqueci de pôr sal mais uma vez. Era péssima na cozinha. Tu voltaste a dizer – “Quando formos mesmo ricos contratamos uma cozinheira” – e riste. Eu fingia sempre que amuava quando dizias isso e dessa vez fingi também. Depois beijaste-me, disseste-me até logo e saíste. Eu levantei a mesa e pensei como era horrível aquela toalha bordada que a minha mãe nos tinha oferecido. Trinta e cinco minutos depois telefonaram-me do hospital e contaram-me do teu acidente. Eu não quis acreditar logo, porque acho que as pessoas nunca acreditam nessas coisas de imediato, demoram aqueles segundos em que o mundo pára. Depois, quando tudo recomeça, algo muito escuro e pesado se abate sobre elas, durante muitos anos. Foi o que aconteceu comigo, sabes?
Agora tenho este teu retrato em cima da mesinha de cabeceira para poder falar contigo todos os dias e recordar-te todas estas coisas, para que tu também não te esqueças e te lembres de mim quando eu chegar. Já não deve demorar muito porque cada vez estou mais fraca e doente. Mas não faz mal.
.................................................................
Os teus netos brincam muito comigo. Riem-se por eu nunca saber onde pus as chaves, onde arrumei as compras, o que jantei ou que recado me deram para eles ao telefone. Dizem que a Avó Helena está a “bater mal”, é assim que eles dizem. Bater mal. Mas como posso eu perder tempo a lembrar-me dessas coisas se tenho outras muito mais importantes que não posso esquecer? O teu sorriso, por exemplo..."

Didas
Farinha Amparo

1. O Escritor famoso e Helena, de Ivo Jeremias



Nunca percebi bem o porquê, talvez com medo de que eu e Helena crescessemos depressa demais ou por outra coisa qualquer, a mãe dela achou por bem mudá-la de escola e proibiu-nos de encontrar. Todos os dias, eu lhe deixava um bilhete, naquele vaso debaixo da janela da cozinha, que ela lia religiosamente todos os dias, antes da Escola. A resposta, deixava no mesmo sítio, onde eu pegava ao fim do dia.
Posso dizer que era o momento mais excitante de todo o dia. O dia inteiro passava... e eu pensando o que lhe iria escrever no próximo bilhete...
Costumávamos ir ao parque andar no nosso baloiço, escondidos dos nossos pais, claro, à 6ª feira a seguir à escola. Dávamos a mão, ríamos dos outros miúdos... e segredavamos. Mas nunca nossos lábios se juntaram.
Depois, insatisfeito com o pouco tempo que passavamos juntos, comecei a ir espreitá-la à sua nova escola na hora de almoço. Ela brincava à Macaca com outras raparigas. Vestido pelos joelhos, tranças compridas e um rosto rosado, perfeito. De tão distraída que estava, não me conseguia vislumbrar no meio dos arbustos que ladeavam o páteo do recreio. Seu perfume inundava todo o ar, embaciando meus óculos fundo de garrafa. Ai os meus óculos... cruz que carreguei com sofrimento, que me tornava alvo da chacota e da piada infantil e terrivelmente cruel das outras crianças...
Dia após dia, lá ia eu, fizesse chuva ou sol, espreitar a minha Helena. Os bilhetes... bem, os bilhetes ela já não os lia todos os dias. Só quando se lembrava. As respostas... bem, as respostas já não eram tão imediatas. Passou de um ritual diário a um mero passatempo facultativo, daquelas tardes em que chovia e não podia brincar na casa das amigas. O Baloiço... bem, o baloiço ainda oscila ao vento... mas não mais nos sentámos nele.
O tempo passou e com ele aumentaram os meus actos voyeuristas... Acompanhava-a todos dias da Escola até casa, obviamente distante o suficiente para que não me notasse. Vi-a no parque brincando com as suas amigas, e ria-me com as suas diabruras. Tempo mais passou e não a deixei. Sempre "juntos". Sempre "perto" um do outro. Aquela árvore em frente à janela do quarto dela era o esconderijo ideal para as minhas observações nocturnas. De tanto a ver vestir e despir, conhecia de cor todos os milimetros do seu corpo... certa noite um suspiro barulhento quase denunciava a minha presença... mas escapei... continuei sempre com a sensação de que Helena sabia de tudo, e que mesmo assim não se importava. Não se sentia vigiada, sentia-se protegida, assim como ela me protegeu naquele dia na escola dos risos dos nosso colegas...
Com os 18 anos, chegou o final do Secundário. Já mulher feita e entrando na vida adulta, estive a seu "lado" no baile de finalistas. Partilhei a felicidade dela quando aquele rapaz de quem gostava tanto, a convidou para dançar. Dançou contigo a valsa que devia ter sido nossa. Vi nos olhos de Helena a sua felicidade ao dar o seu 1º beijo. Não foram meus lábios que foram tocados, mas senti a respiração e seu sabor como se tivesse sido eu. Tal como nos sonhos que tinha desde há alguns anos a esta parte e que estranhamente me provocavam suores frios...
Quando abriu os olhos, Helena viu-me lá ao fundo... no canto do salão. Por trás destes óculos infernais que ela não esqueceu. A minha cara, embora diferente da cara que ela conheceu, não dava para esquecer. Mesmo duvidando, o meu sorriso me denunciou. Senti no olhar dela que já não precisava da minha "protecção". Este Anjo da Guarda ficou livre naquele beijo, livre para seguir seu caminho.
Assim o fiz.
Na minha memória o nosso baloiço ainda oscila. Ainda damos as mãos... Ainda nos rimos... Ainda segredamos... Ainda te sinto a meu lado...
Serás sempre a minha pequena Helena. A minha pequena e doce Helena...

Ivo Jeremias
Olho Bem Aberto

julho 28, 2005

Regulamento

O regulamento do Concurso pode ser consultado aqui.

Concurso de Textos - O Escritor Famoso

A saga continua!

Num blogue perto de si!




Posted by Picasa

julho 25, 2005

Concurso O Escritor Famoso ... e Helena



O Escritor Famoso não morreu! Era o que faltava! Continua por aí a passear de blog em blog e todos lhe abrem as portas, mesmo aqueles que vão de férias. Eu, por exemplo, vou dar-lhe as chaves de casa. Apesar de ser um pouco temperamental, é alguém em quem confio. E a gata gosta dele!

Vamos pois começar uma segunda série d'O Escritor Famoso. Desta vez, o mote é o seguinte:

(...) Depois os que riam passaram a chamar-nos namorados. Às vezes atiravam-nos uma pedra que nunca acertava e fugiam. Começámos a sair da escola durante o intervalo grande, que era de trinta minutos, acho eu, e desfrutávamos o facto de àquela hora o baloiço do parque estar sempre livre. Às vezes a meia hora passava a uma, ou mais, até que a professora chamou os nossos pais por mau comportamento. O que é que eu andava a fazer com a Helena, perguntou-me a minha mãe à noite. Andamos de baloiço, respondi. (...)

Levantamos um pouco do véu que paira sobre a relação (antiga) do escritor famoso e Helena. Como evoluiu no tempo esta relação, não sabemos. Aqui e ali lemos qualquer coisa, mas existem muitas pontas soltas neste romance (?). O desafio é precisamente o de imaginar a história que uniu (ou separou) estes dois personagens.

As regras deste Concurso são similares às do anterior:
  • Não existe nenhuma restrição em termos de estilo, forma, língua, linguagem ou número de linhas.
  • São admitidas todas as classes de participantes, com ou sem blog/site, antigos participantes e reincidentes.
  • A data limite de entrega/comunicação dos textos é o dia 6 de Agosto (às 24:00).
  • No dia 8 de Agosto serão publicados todos os textos concorrentes e dar-se-á início à votação.
  • No dia 10 de Agosto, o júri permanente do Concurso comunicará qual é o texto premiado.
  • Ao vencedor do Concurso será oferecido um livro à sua escolha de um escritor famoso ou nem por isso.

Em Setembro será organizada uma cerimónia que reunirá todos os participantes nos sucessivos Concursos d' O Escritor Famoso, na Livraria O Navio de Espelhos, em Aveiro (entidade patrocinadora).

DIVULGUEM!

Concurso O Escritor Famoso II



Em preparação...
Porque o Escritor Famoso continua a vadiar por aí.


Logotipo: Escrita Solta
Patrocínio: O Navio de Espelhos

julho 24, 2005

Não, muito obrigado!



Não imaginam como foi difícil para o júri permanente deste Concurso hierarquizar a originalidade e o talento literários daqueles que se foram cruzando com o Escritor Famoso, desde que este iniciou o seu passeio pela blogosfera. Ficámos com vontade de também responder com um "não, muito obrigado!".

Como definido no Regulamento, numa primeira fase, todos os visitantes desta casa (com ou sem blog) seriam chamados para nomear o seu texto preferido. Essa consulta foi realizada e traduziu-se nos seguintes resultados:

Textos mais Votados
n° 5 - Maria Heli, O escritor famoso (14)
n° 8 - Rosarinho, A visita do escritor famoso (9)
n° 9 - Ivar Corceiro, Helena (5)
n°16 - mfc, O escritor famoso passou por aqui (3)

Paralelamente, cada membro do júri permanente do Concurso (Batatas, O'Sanji, Sónia Sequeira e MRF) avaliou individualmente os 18 textos, atribuindo-lhes uma pontuação de 0 a 10. Dessa avaliação resultou o seguinte ranking:

Textos mais pontuados
n° 9, Ivar Corceiro, Helena (36)
n° 7, Rui, O escritor famoso (35)
n° 8, Rosarinho, A visita do escritor famoso (33)
n° 3, George Cassiel, Confissões de um escritor famoso (32)
n° 16, mfc, O escritor famoso passou por aqui (32)
n° 5, Maria Heli, O escritor famoso (31)

A qualidade global dos textos era bastante elevada, de forma que todos os outros textos ficaram com uma pontuação superior a (25). E a subjectividade é um vício humano, às vezes maldito!

Pessoalmente descobri em todos os textos uma frase, uma mensagem, um sense ou non sense, que senti como notas agudas e deliciosas de sensibilidade. Essas "notas" vão aparecer no Divas assim de tempos a tempos para matar saudades destas leituras.

Os dados foram lançados e nas 24 horas que nos foram concedidas para decidirmos sobre um vencedor final, chegámos à conclusão de que... não, muito obrigada! Não vamos nomear um vencedor! Vamos distinguir todos os participantes com menções honrosas!

E não se ouvirá o "the winner is". Preferimos antes "o prémio vai para".

E o prémio vai para...


Maria Heli
Reagindo ao mote inicial imaginou um diálogo inteligente e pertinente entre (dois) escritores. O público leu e gostou. A reacção "massiva" dos seus fãs revela também que ela já é uma escritora com carisma.

e para...

Ivar Corceiro

Reflectindo sobre a subjectividade da fama, inventou um escritor e uma amada. E ela é todas as pessoas do mundo. A prosa muito poética de um escritor que vocês vão conhecer melhor, mais dia menos dia...

O Navio de Espelhos terá muito prazer em oferecer a estes dois ilustres premiados um livro à sua escolha.



E agora vamos reler os dois textos:


O escritor famoso, de Maria Heli

Ela abordou o escritor famoso, segura nos gestos, na postura, na voz.
- Vim aqui com o propósito de lhe pedir o favor de ler este original de que sou autora. A sua opinião é importante. Talvez decisiva.
O escritor famoso estendeu a mão para segurar o original, enquanto lhe perguntou pelo nome.
- Maria Helena.
- Pois até o leio, Maria Helena, se me disser porque escreve. Sorriu.
- Bem…porque gosto de escrever!- Não é suficiente. Hoje, toda a gente gosta de escrever! Quase aposto que tem um blog…Tem?
- Não. Não tenho, mas escrevo num.
- É a mesma coisa. Pertence ao grupo banal e eclético daqueles para quem não é suficiente dizer. Pois claro que se acabaram as tertúlias de café. Hoje já ninguém conversa, a oralidade está a perder-se. Toda a gente quer fixar as palavras no papel ou no ecrã. No silêncio de um suporte qualquer. A honra da palavra extingue-se. A palavra dita está rouca. A vulgaridade escreve-se. Deve achar que o que tem para dizer é tão importante que tem de o fixar, gravar em caracteres, se possível impressos. Já ninguém conta. Já ninguém diz. Ambiciona escrever um livro…
- Lê ou não lê o original?
- Dá-lhe prazer escrever?
- Sim, claro!
- Nada é claro para quem escreve, minha senhora! Provavelmente tem aqui um depósito de coisas claras que vão ofuscar o leitor....
-E o senhor começou ou não a escrever livros?
-Tenho, como sabe, dezenas e dezenas de livros publicados, tiragens fenomenais. Faço sessões de autógrafos. Pedem-me para ler originais. No entanto, não tenho um blog, nem escrevo para nenhum…
- Dê cá o original! Nunca imaginei que…

- Não! Desculpe… Agora vou ler o seu original. Pediu-me que o lesse. Ou acha que numa conversa me dizia tudo o que tem aqui escrito?


Helena, de Ivar Corceiro

Esta é a história dum violino que nunca o chegou a ser. É tocado, às vezes, durante horas a fio pelas mãos dum homem que bebe demais. Desculpem, que escreve demais. No balcão do bar onde, no fundo de copos de vinho morno, vai asfixiando as palavras dos que lhe falam demais, decidiu um dia só escrever. Demais também, para que só o ouçam voluntariamente.
Lá fora os eléctricos coxeiam pelas tortuosas artérias da cidade, como bichos da seda, pensa ele. Pensa-o desde que deixou Helena presa a uma varanda pequena, mandando-lhe beijos que voavam como borboletas ao vento até baterem nos vidros, e que com o tempo se transformaram num adeus.
Desde então que as noites estão sempre tão vazias, e as tardes também. E as manhãs também, mas num sono que vai prolongando mais suavemente a vida. Vai enchendo tudo com música, tocada pela embriaguez dum violino inexistente. Há uns dias parou. Pintou, escondido pela neblina noctívaga, uma frase em frente à varanda de Helena: “Os eléctricos são bichos da seda, cujas borboletas morrem ao desovar”. Ela já leu. Ela é todas as pessoas do mundo. Todas as pessoas do mundo já leram. Ele é famoso.


P.S.: Maria Heli e Ivar Corceiro, quem é esta Helena que vocês parecem conhecer tão bem?

julho 21, 2005

Concurso O Escritor Famoso. Eleições Abertas



Apartir deste momento e até às 24 horas do dia 22 de Julho todos os visitantes deste blog poderão eleger o seu texto preferido, relativo ao escritor famoso que um dia apareceu na blogosfera e se pôs a passear de blog em blog.

Os Candidatos são:

1. George Cassiel: Era um escritor famoso. Sentou-se no degrau da porta de casa.(...)
Título: Andará um escritor a passear de blog para blog?

2. Wilson T do Escrita Solta: Bem. Não se percebe bem porquê (não eu claro cujos raciocínios não ultrapassam uma simplicidade provinciana) mas o indivíduo chegou lá a esse curral onde todos parecemos querer chegar (...) Também pode ler o texto aqui.
Título: O escritor famoso

3. George Cassiel: Queria ver-me livre daquilo que estava aqui dentro, algures entre a memória e uma visão do futuro, mas que não saía.(...)
Título: Confissões de um escritor famoso

4. Alfredo Caiano Silvestre do Souselense: Figura sombria. Alto. Magro. Escanzelado. Bigode farto e tingido pelos fumos. (...)
Título: José

5. Maria Heli do Amor e Ócio: Ela abordou o escritor famoso, segura nos gestos, na postura, na voz. (...)
Também pode ler o texto aqui.
Título: O escritor famoso

6. Angela do (In)Certezas: Afastou-se, enfiando as 149 páginas debaixo do braço. «Se calhar», pensou, «viu todo este volume e não tinha tempo». Ponderou. «Foi a camisola amarela.(...)
Título: O escritor famoso passou por aqui

7. Rui do Onde Mudar: Tinha comprado todos os seus livros. Via-o muitas vezes a almoçar na cantina e imaginou-se a pedir-lhe um autógrafo, uma audácia que nunca conseguiu pôr em prática. (...)
Título: O escritor famoso

8. Rosarinho do Farinha Amparo: A minha colega Carminho aproximou-se, excitada. Tocou-me no braço com o braço dela naquele gesto que se quer discreto e murmurou – "Olha o escritor que aparece na televisão ao sábado!" (...)
Título: A visita do escritor famoso

9. Ivar Corceiro do Bagaço Amarelo: Esta é a história dum violino que nunca o chegou a ser. É tocado, às vezes, durante horas a fio pelas mãos dum homem que bebe demais. Desculpem, que escreve demais.(...)
Título: Helena

10. Santa Cita: Custava-lhe. Mas tinha-lhe custado mais quando, tendo acedido ao pedido, tivera de dizer, "não presta". (...)
Título: O escritor famoso

11. Lilly Rose do Antes que me deite: Era um escritor famoso. antes de publicar.
Durante dez anos escreveu livros sem nunca pensar em publicá-los. Estipulou um horário, escrevia com método.(...)
Título: O escritor famoso

12. Joaquim Pavão: Vazio e generoso. Deu tanto e não ganhei nada. Tentei tocar-lhe na esperança de possuir algo mais do que a negação do ter. Ele sorria e entregava-me mais e mais.(...)
Título:(dedicado)a Boris Vian

13. André do Devaneios sem sentido: Entrou num bar...Sem clientes, o bar silencioso ainda o deprimiu mais... Pediu um Whisky... Qualquer um... Depois outro... Outro... Outro...(...)
Também pode ler aqui.
Título: sem título

14. Xinha do Bye Blog: As pessoas sempre achavam que lá por ser reconhecido teria uma maior possibilidade de saber se o que eles escreviam teria algum valor para quem lê.
Respondia-lhes não muito obrigado porque nada mais poderia fazer…(...)
Título: Anda um escritor famoso a passear de blog em blog

15. Transpose do Blue Velvet: Era um escritor famoso. Pronto, escritor, escritor famoso, é como quem diz. Era um gajo famoso, o chamado socialite, a celebridade que conseguia alinhavar umas linhas entre o chá das quatro e a ida ao ginásio. (...)
Título: E raid? Custa apenas dois euros...

16. mfc do Pé de meia: Todos os dias se sentava na mesma mesa do café, começando com o ritual costumeiro.Tirava com cuidado da pasta umas folhas brancas A4, colocando-as ao canto esquerdo da mesa. (...)
Título: O escritor famoso passou por aqui

17. Ivo Jeremias do Olho Bem Aberto: Um Homem abençoado com o dom de bem escrever.
Sua escrita apaixonava, sentia-se nas letras o seu sofrer. Sua alma escrevia por si
através de uma caneta. Perdia-se no tempo, como um grão numa ampulheta. (...)
Título: Era um escritor famoso (que já não existe)

18. Joaninha:
Mas porquê? Nada se passa sem que um porquê esteja a servir de pano de fundo… (...)
Título: Anda um escritor a passear de blog em blog

A ordem apresentada não tem qualquer significado. Respeitou-se apenas a ordem de entrada dos textos no blog. Para votarem, basta nomearem O vosso texto preferido (apenas um) nos "comentários".
Obrigada!

julho 20, 2005

Concurso O Escritor Famoso












  • Termina hoje à meia-noite o prazo para entrega de textos relacionados com o escritor famoso (concurso)

  • À mesma hora dá-se início à votação - não do melhor texto, mas - do texto preferido pelos visitantes deste blog

  • Essa votação vai decorrer até à meia-noite do dia 22 de Julho

  • O júri permanente deste concurso terá em consideração os resultados dessa votação

  • Os membros desse júri são os seguintes: O'Sanji, do Plan(o)Alto; batatas, do Batatas for the people; Sónia Sequeira, da Livraria O Navio de Espelhos et moi-même!

  • No dia 24 de Julho será comunicada a decisão do júri
  • O Grande Vencedor receberá um livro à sua escolha de Um Escritor Famoso, ou nem por isso.

Este concurso é patrocinado pela Livraria O Navio de Espelhos em Aveiro.

E ainda ... (dois textos)

(XIX) E ainda a tempo, a Joaninha do meinemliebe e do Joaninha.

Era um escritor famoso. Quando alguém com ambições na escrita se aproximava com a intenção de lhe deixar um manuscrito para que o lesse e avaliasse, ele respondia: não, muito obrigado!

Mas porquê?
Nada se passa sem que um porquê esteja a servir de pano de fundo…

Pois bem, a Mariazinha, mulher de uns quarenta anos, anafada e de faces sempre ruborizadas, muito atarefada nas suas lides domésticas após o regresso do escritório, onde trabalhava como ajudante de contabilidade, apaixonou-se pelo jovem paquete do escritório e porque ele era mesmo mais jovem, não disse nada, mas foi escrevendo e reescrevendo textozitos e poesias que ia guardando no fundo da gaveta das cópias das facturas pró-forma…

O mocetão despediu-se alguns anos depois, porque entretanto era estagiário num escritório de advogados, onde ficaria posteriormente, depois de ter o “canudo” na mão… e a Mariazinha, com a gaveta atulhada de manuscritos, resolveu empacotá-los e levá-los para casa, para chorar a reler a desdita do seu amor frustrado…

Nas férias do ano seguinte, uma prima da Madeira, que vinha dos Estados Unidos para matar saudades da família, deu por acaso com o pacote dos escritos da Mariazinha e vai de lê-los de fio a pavio e achou que eram uma obra de arte escrita…

Desculpando-se pela bisbilhotice, foi dizendo à Mariazinha que deveria publicar tudo aquilo, pois era um dó não serem lidos textos tão românticos… dignos de um qualquer bom escritor…

Ora aqui o nosso amigo escritor entra na história.

Reginaldo, homem famoso pela escrita, de livros publicados e premiados, vivia na mesma rua, uns quarteirões abaixo e era cliente do mesmo talho que a Mariazinha. Era conhecido pelo filantropo e poucos já o haviam ouvido a falar, pois era homem de poucas palavras…Depois ainda ficou mais acabrunhado e sempre com um “não” pronto a sair da sua boca, sempre que via um qualquer papel estendido em sua direcção…

Pois em conversa de balcão, enquanto esperavam ser aviados, a Mariazinha meteu conversa com o afamado escritor, pedindo-lhe um grande favor. Primeiro, o solicito cavalheiro, foi todo atenções e foi dizendo que estava ao dispor para o que fosse necessário…mal sabia que eram os escritos da Mariazinha…

Passados dois dias, de pacote debaixo do braço, a nossa heroína foi ter com o escritor e deu-lhe a sua preciosidade…

O Reginaldo, no sossego da sua casa leu algumas folhas e ficou triste. Como haveria ele de dizer àquela mulher de rosto bonacheirão que o que escrevera apenas poderia dizer respeito a um tal Francisco? Mas, encheu-se de coragem e deixou no talho um recadinho, dizendo que a Dona Mariazinha deveria ir falar com ele no Café da esquina, ao fim da tarde.

Meu dito e meu feito. À hora combinada, ambos sentados em frente a uma mesa redonda do dito café e com o embrulho dos papéis entre as duas chávenas de descafeinado, trocaram algumas simples palavras. A Mariazinha de agradecimentos múltiplos e ele, muito embuchado, dizia que ela deveria continuar a escrever, melhorando sempre, para poder vir a ser publicada a sua obra…

Mariazinha, gorducha, bonacheirona e de faces ruborizadas, percebeu logo o que o escritor queria dizer e agradecendo sempre, levantou-se e foi para casa.

Quando Reginaldo voltou ao talho uns dias depois, para comprar o seu bifezinho picado, recebeu a notícia da morte trágica de Mariazinha… Foi um duro golpe!

Pois a verdade é que aquela mulher, que vivera sempre de sonhos irrealizáveis, não resistira a mais um e pusera termo à vida vazia e desiludida, com uma dose de comprimidos para dormir, que vinha tomando desde que o seu apaixonado saíra lá do escritório.

O Reginaldo, escritor afamado, que também escrevera durante décadas e que também havia escondido a sua obra, nunca lhe passara pela cabeça que ao entrar na ribalta, havia de causar tamanho desgosto em alguém… por isso, a partir dessa data, nunca mais aceitou opinar fosse sobre o que fosse, escrito fosse por quem fosse…

Joaninha



(XVIII) Antes da meia-noite, o escritor famoso passou ainda pelo Olho Bem Aberto

Título: Era um escritor famoso (que já não existe)

Um Homem abençoado
com o dom de bem escrever.
Sua escrita apaixonava,
sentia-se nas letras o seu sofrer.
Sua alma escrevia por si
através de uma caneta.
Perdia-se no tempo,
como um grão numa ampulheta.
Um desnorte criativo,
partindo para outro lugar.
Onde as Musas o esperavam
para o inspirar.
Que mundo deslubrante
é aquele que vê!
Um lugar apaixonante,
que olha mas não crê.
De volta a si,
e ao Mundo que é seu,
começou a descrever,
a aventura que viveu.
A tela pautada,
descansava à sua frente,
Sua pena dançava,
deslizando sorridente.
Enchia páginas
com sangue da sua vida.
Assinando com o tempo,
uma triste despedida...
Levado por sua alma
Famoso se tornou.
O dinheiro o corrompeu,
Egocêntrico ficou.
Hoje escreve de cor,
sem sentimento algum.
Segue altivo e egoísta,
sem amor nenhum.
O Amor pela escrita,
que viciou seus leitores,
trocou-o pela "guita",
sem brilho ou louvores.
Hoje é amargo,
seco, sozinho e triste.
Sua alma de escritor,
simplesmente não existe.

Ivo Jeremias

E outros 4 blogs por onde o Escritor Famoso passou


Todos os dias se sentava na mesma mesa do café, começando com o ritual costumeiro.
Tirava com cuidado da pasta umas folhas brancas A4, colocando-as ao canto esquerdo da mesa. Em seguida retirava do porta lápis o seu "Viarco" nº 2 (sim, escrevia sempre a lápis) e a inseparável borracha, colocando-os, lado a lado, na parte direita.
A parte central da mesa estava sempre livre.
Era chegada a altura do empregado trazer a bica. Sacudia apenas o pacote de açúcar, guardando-o no bolso, mexendo o café sempre no sentido dos ponteiros do relógio.
Sorvia-o olhando quem estava, pondo a chávena, já vazia, no extremo central da mesa.
Retirava então os óculos. Pegava numa das folhas A4 centrando-a um pouco em diagonal, compondo-se bem na cadeira de verga.
Com o lápis na mão esquerda, (era esquerdino sabiam?) datava sempre o texto ao cimo à direita. Pousava de novo o lápis, segurava o queixo na mão com o cotovelo apoiado na mesa, parecendo buscar inspiração. Buscava-a até que se levantava e reunia todo o material na pasta negra já roçada.
Todos os dias o mesmo ritual era repetido exaustivamente, como se de um maquinismo de precisão se tratasse.
Apenas a data era aposta na brancura da A4...
Um dia um novato, que por lá aparecia, dirigiu-se-lhe perguntando:
- Mas afinal sobre que escreve o senhor?
O homem olhou-o incrédulo e com uma candura desarmante disse:
- Escrevo sobre o Tempo...!

mfc



(XVI)
Blue Velvet. Inspirado!

Título: E raid? Custa apenas dois euros...

Era um escritor famoso. Pronto, escritor, escritor famoso, é como quem diz. Era um gajo famoso, o chamado socialite, a celebridade que conseguia alinhavar umas linhas entre o chá das quatro e a ida ao ginásio.
Ser um bom escritor sempre tinha sido o seu sonho, a sua obsessão. Queria, um dia, ser reconhecido como um dos Grandes, um dos Bons, mas por mais que tentasse nunca conseguia. Por vezes até prescindia do seu solário, das suas idas às capitais mundiais da moda, dos seus jantares de gala, das suas idas à discoteca. Tudo porque sentia aquela inspiração repentina que sempre ouviu dizer que dava aos iluminados. E escrevia, escrevia. E riscava, riscava. E rasgava, rasgava.
Os livros, esses, vendiam bem, bastante bem até. Bem melhor que parte dos consagrados da nossa praça, mas para sua infelicidade sabia o porquê de tanto sucesso.
Preferia viver na estupidez a ser confrontado com tão terrível realidade. À noite quando ia para a cama, chorava. Baixinho para ninguém o ouvir, mas as paredes sempre tiveram ouvidos.
O sucesso das vendas explodiu, implodindo na mesma proporcionalidade mas com um factor multiplicativo de 20 a sua agonia e a sua angustia. As suas aventuras literárias tinham que acabar de uma vez por todas.
No dia seguinte acordou e desceu para o jardim para tomar o pequeno-almoço. O tempo custava a passar. Passados cinco minutos, desceu o filho. Deu-lhe um beijo e sentou-se à sua direita. O escriva olho-o com ternura, puxou a mão atrás, deu-lhe um estalo e começou a chrorar:
- Filho, não te levantes mais durante a noite para melhorares os textos do pai. Não entendes que sou um bluff.
- Mas Pai... Só queria ajudar... – retorquiu o adolescente com a cara em lágrimas.E assim foi, que o escritor famoso deixou de ser escritor e continuou a ser famoso. Isto é, deixou de ser escritor é como quem diz. Escreve de quando em vez uns artigos para os metrossexuais acerca do que está “trendy” no mundo civilizado. Ele bem tentou parar, mas o bichinho, esse, nunca o consegui matar.

Transpose



(XV) O escritor famoso passou pelo Bye Blog mas não foi para um adeus...


As pessoas sempre achavam que lá por ser reconhecido teria uma maior possibilidade de saber se o que eles escreviam teria algum valor para quem lê.
Respondia-lhes não muito obrigado porque nada mais poderia fazer… escrevia não porque queria ser um “escritor famoso”, a fama de nada lhe servia quando tinha tantas palavras dentro dele para deitar para fora.
Escrevia por puro egoísmo… despejava todos os sentimentos que encontrava no recanto do seu cérebro, do seu peito, da sua alma até não ter mais páginas onde eles pudessem ser depositados.
Não lhe interessava o que os outros escreviam porque também não lhe interessava o que ele escrevia. Nunca relia o que escrevia, simplesmente já estava lá, na folha… e supostamente longe dele. Escrevia porque dizer não conseguia, dizer não chegava, precisa de mais!... Precisava de deixar o que o assoberbava numa folha de papel para lá permanecer e não o incomodar mais.
O seu primeiro plano era queimar tudo depois de escrever, como forma de catarse, mas certa altura alguém muito próximo descobriu as suas páginas plenas de si e mandou-as para um editor.
A partir daí as suas palavras não mais tiveram descanso, passaram de mão em mão, de boca em boca, encontrando-se com os assoberbamentos que tanta gente encerra dentro de si, fazendo com que essas pessoas pudessem também ter algum tipo de catarse junto com a dele.

Não, muito obrigado! Não era por desprezo, não era por não o saber fazer… era apenas por não ter espaço para mais…

Xinha



(XIV) Se houvesse dúvidas sobre a "unicidade" do escritor famoso, elas deixavam de fazer sentido, depois desta experiência do André. E não são Devaneios sem sentido...

Entrou num bar...
Sem clientes, o bar silencioso ainda o deprimiu mais...
Pediu um Whisky...
Qualquer um...
Depois outro...
Outro...
Outro...
Ainda outro...
-Amigo, acho que já teve a sua conta por hoje...
-Sabe com quem é que está a falar? Sou um escritor famoso!
Indicou-lhe a saída...
Atirou uma nota de 20 para cima do balcão e saiu a cambalear...
Não lhe saía da ideia a conversa com Maria Helena...
Nunca lhe custara tanto a recusar ler o trabalho de alguém...
Porquê?

André Barbosa

O Escritor continua a passear de blog em blog

(XIII) Aconteceu! O escritor famoso saiu da blogosfera (para logo voltar a entrar). Não resistiu e visitou o músico Joaquim Pavão. O resultado é espantoso, notas musicais foram transformadas em letras. Leiam este texto dedicado.

a Boris Vian

Vazio e generoso. Deu tanto e não ganhei nada. Tentei tocar-lhe na esperança de possuir algo mais do que a negação do ter. Ele sorria e entregava-me mais e mais. Cheio de tanto continuava a tentar o toque. A Albertina é uma rica senhora, descobriu que o volume 3 é parecido com o 24. Descobri que as diferenças e semelhanças são afinal maiores. Ele lá me ia dando algo mais. A Albertina cheirava mal dos sovacos porque poupava água não se lavando. Os ambientalistas agradecem até lhe conhecer e recebi mais nada. Era simpático, este generoso. -“Vendi uma primeira edição em cinco horas, deve ser um recorde” contava ele. Albertina não puxava o seu autoclismo para não deixar os sovacos invejosos. Tinha já o novo volume, o tão esperado 56 encomendado há 3 meses. Despedi-me dele e afastei-me sempre tentando o toque. Descobri que não se apalpam personagens. Quanto muito recebemos. A Albertina lê o vazio porque pior seria poupar tempo. Eu vou ler o volume 2. O primeiro recebi no encontro no supermercado. Duas lixadeiras e um estojo de beleza, ganha um livro e o direito a um autógrafo. O livro, o volume 2, o encontro, o volume 1 e a sua assinatura era bonita. Trabalhada a tal ponto que todas as letras desenhavam uma bonita imagem. A Albertina lia, eu fui tomar banho.

Joaquim Pavão



(XII) Antes que me deite, o escritor famoso, novamente:

Era um escritor famoso. antes de publicar.
Durante dez anos escreveu livros sem nunca pensar em publicá-los. Estipulou um horário, escrevia com método. Até ao dia em que entregou 23 originais de romances, poesia, teatro e até um ensaio. Nos dez anos que se seguiram as obras foram sendo editadas. Ele continuou a escrever mas com menor frequência. Um dia perguntaram-lhe porque guardara as obras. Ele respondeu. Para ser livre. E porque as revelara um dia? Para sobreviver. E agora que perdeu a liberdade, como sobrevive? Ele respondeu. Agora, o escritor famoso já não existe.

Lilly Rose



(XI) Santa Cita:

Era um escritor famoso. Quando alguém com ambições na escrita se aproximava com a intenção de lhe deixar um manuscrito para que o lesse e avaliasse, ele respondia: não, muito obrigado!

Custava-lhe.
Mas tinha-lhe custado mais quando, tendo acedido ao pedido, tivera de dizer, "não presta".

(Foi, contudo, o melhor conselho que me deu.)

julho 18, 2005

Concurso Escritor Famoso











Este concurso, nascido de forma (quase) espontânea, padece de alguma falta de regulamento. Vamos lá tentar colmatar a lacuna:


  • O Concurso Escritor Famoso foi lançado na tardinha do dia 14 de Julho e o prazo para envio/comunicação dos textos terminará à meia-noite do dia 20 de Julho. O mote para este concurso foi lançado num post do Divas & Contrabaixos a 12 de Julho:
Era um escritor famoso. Quando alguém com ambições na escrita se aproximava com a intenção de lhe deixar um manuscrito para que o lesse e avaliasse, ele respondia: não, muito obrigado!
  • Depois do aparecimento deste post, um fenómeno estranho e delicioso ocorreu na blogosfera: o escritor famoso começou a passear-se de blog em blog, deixando textos ou inspirando reflexões e novas histórias. George Cassiel foi o primeiro blogger a receber a visita do escritor famoso e outros se seguiram.
  • Os textos que registam essa passagem foram/serão aqui publicados.
  • São aceites todos os estilos literários e não há limite de páginas. Todas as línguas e linguagens são consideradas.
  • Para seleccionar o texto mais impressionante sobre o Escritor Famoso, será constituido um júri permanente. Este júri deverá considerar os votos registados na Eleição Aberta a decorrer nos dias 21 e 22. Nesses dias, todos os visitantes do Divas & Contrabaixos terão oportunidade de votar no seu texto preferido.
  • No dia 24 de Julho será apresentado O Grande Vencedor.
  • O Grande Vencedor receberá um livro à sua escolha de Um Escritor Famoso, ou nem por isso.

Este concurso é patrocinado pela Livraria O Navio de Espelhos em Aveiro.

O logotipo do Concurso foi feito pelo Souselense.

Mais 4 textos

(X) No Bagaço Amarelo, Helena

Esta é a história dum violino que nunca o chegou a ser. É tocado, às vezes, durante horas a fio pelas mãos dum homem que bebe demais. Desculpem, que escreve demais. No balcão do bar onde, no fundo de copos de vinho morno, vai asfixiando as palavras dos que lhe falam demais, decidiu um dia só escrever. Demais também, para que só o ouçam voluntariamente.Lá fora os eléctricos coxeiam pelas tortuosas artérias da cidade, como bichos da seda, pensa ele. Pensa-o desde que deixou Helena presa a uma varanda pequena, mandando-lhe beijos que voavam como borboletas ao vento até baterem nos vidros, e que com o tempo se transformaram num adeus. Desde então que as noites estão sempre tão vazias, e as tardes também. E as manhãs também, mas num sono que vai prolongando mais suavemente a vida. Vai enchendo tudo com música, tocada pela embriaguez dum violino inexistente. Há uns dias parou. Pintou, escondido pela neblina noctívaga, uma frase em frente à varanda de Helena: “Os eléctricos são bichos da seda, cujas borboletas morrem ao desovar”. Ela já leu. Ela é todas as pessoas do mundo. Todas as pessoas do mundo já leram. Ele é famoso.

Ivar Corceiro



(IX) No Farinha Amparo houve rebelião. Não é sexta-feira e a Rosarinho (sem o conhecimento da Didas?) apareceu no balcão da escrita!

A minha colega Carminho aproximou-se, excitada. Tocou-me no braço com o braço dela naquele gesto que se quer discreto e murmurou – “Olha o escritor que aparece na televisão ao sábado! Está ali ao balcão!”. A Carminho é loira e branca e tinha as faces ruborizadas. Tremia. Foi só por isso que pude perceber que algo se passava, já que o barulho do moinho de café não deixava ouvir frases sussurradas. “O quê?” – perguntei aproximando o meu rosto do dela – “Não olhes agora!” – foi a resposta que, como se sabe, tem sempre o efeito inverso, pelo que me virei de imediato na direcção oposta, a do balcão. O meu olhar cruzou-se com o dele e senti crescer de repente uma bola de ar comprimido dentro do peito. Subiu a temperatura na minha cabeça toda e voltei-me de novo para o moinho do café – “É o escritor da televisão!” – disse para a Carminho tentando controlar o tom de voz embora esteja quase certa de ter sido um esforço vão. - “É o que te estou a tentar dizer há que tempos!” – retorquiu ela rematando com um sonoro “Parva!”, enquanto se afastava lá para dentro para me deixar ser eu a atendê-lo.Lá na pastelaria todas sabiam o fascínio que eu nutria por ele, o escritor de olhar calmo, que tinha um programa na televisão ao sábado, a horas tardias e naquele canal que ninguém vê. Aquele homem muito mais velho e tão diferente dos rapazes suburbanos que me tentavam impressionar em manobras com as motorizadas potentes e me mandavam postais com erros de ortografia.Todas sabiam que eu lhe devorava as palavras sem as entender na sua totalidade, que ficava noite dentro a ouvi-lo falar de coisas simples que ao saírem da sua boca eram grandiosas. Acho mesmo que todas sabiam que, nas minhas fantasias mais secretas, ele era só meu.O que nenhuma sabia era os inúmeros cadernos de linhas comprados no supermercado que eu preenchia com tentativas de poemas e contos. E o desejo inconfessado que ele os lesse. Aproximei-me do balcão à toa. – “Um café” – pediu – “cheio, se faz favor”. Ali tão perto pude sentir o seu cheiro, que se sobrepunha ao do café, do pão fresco, dos pastéis de nata. Fechei os olhos e decorei-o, para ficar para sempre com ele.Por fim, numa tentativa desesperada de o possuir mas sem saber como, murmurei um “Só um momento” e fui lá dentro ao armazém. Peguei numa chávena. Apertei-a entre as minhas mãos. Encostei-a à minha face. Depois fixei-a um pouco com o olhar, concentrei-me e, num movimento lento mas firme, passei a língua toda por ela.Voltei e servi o café. Fiquei a ver quando ele pegou na chávena e a levou à boca. Foi nesse momento que nos beijámos sem nunca nos termos tocado. Porque nem mesmo quando recebi a moeda e lhe fiz o troco consegui aproximar a minha mão da sua a ponto de poder sentir a sua pele. Depois, vi-o afastar-se e sair. Segui-o com os olhos até ele dobrar a esquina.Tive a certeza que nunca mais o veria, mas levei a chávena para casa e guardei-a junto dos meus cadernos de poemas e contos.

Rosarinho



(VIII) Ei-lo por aqui, Onde Mudar!

Tinha comprado todos os seus livros. Via-o muitas vezes a almoçar na cantina e imaginou-se a pedir-lhe um autógrafo, uma audácia que nunca conseguiu pôr em prática. Uma vez viu vários exemplares dum romance dele, muito amado, a monte com muitos outros e em saldo. Doeu-lhe. Comprou-os todos, foi oferecendo aos amigos e ficou com o último como recordação. Decidiu-se a escrever-lhe a contar o que tinha feito e a comunicar-lhe a imensa gratidão que sentia por ele ter escrito tantos livros inesquecíveis. Em resposta recebeu um cartão com meia dúzia de linhas, palavras neutras e quase indecifráveis. Não soube se devia responder, dada a frieza. Pensou: é um escritor famoso, porque havia de perder tempo com uma pessoa banal?Continuou a comprar todos os seus livros. Anos depois vê num uma referência maravilhada e bela a este episódio. Chorou por dentro.

Rui



(VII) O escritor famoso também passou pelo (In)Certezas

Era um escritor famoso. Quando alguém com ambições na escrita se aproximava com a intenção de lhe deixar um manuscrito para que o lesse e avaliasse, ele respondia: não, muito obrigado!

Afastou-se, enfiando as 149 páginas debaixo do braço. «Se calhar», pensou, «viu este volume todo e não tinha tempo». Ponderou. «Se calhar, foi por causa desta camisola amarela. Bem sabia que não devia ter trazido uma camisola amarela. O azul claro, o branco tinham sido melhores. O amarelo pô-lo nervoso, de certeza. E o volume de páginas também.»

Sentou-se, a aprender com o rio, como sempre gostava de fazer. Afagou o CD e guardou-o, cheio que estava com aquelas palavras. E foi largando o papel. Uma a uma, as páginas voaram. Levou-as o rio, amolecendo-as e desfazendo-as, os peixes admirados com aquele novo alimento, nada saboroso.

Diz-se que, ainda hoje, as gaivotas se divertem com as suas palavras.

Do escritor famoso, soube no dia seguinte ter ganho o Nobel. E conseguiu sorrir com isso. Ia imprimir tudo uma outra vez e partir em busca de um outro escritor famoso. Mas, desta vez, ia usar uma camisola branca.

Angela

julho 14, 2005

Regulamento do Concurso "Escritor Famoso"

O escritor famoso anda mesmo a passear por aí. E estão todos convidados a abrir-lhe as portas. Antes que ele decida voltar ao seu país, vamos recolher todas as notas, textos e encontros que se relacionem com ele. Depois abrimos um Concurso em que o júri será composto por todos vós. O prémio para o vencedor do melhor encontro com o escritor famoso é um livro à sua escolha... de um escritor famoso, ou nem por isso.

Divulguem e participem!

Este concurso é patrocinado pela Livraria O Navio de Espelhos em Aveiro

Anda um escritor a passear de blog em blog. Mais três textos

(VI) Ele começou a deambulação neste blog. E parece que voltou mais uma vez. Desta vez, deixou as Confissões de um Escritor Famoso.

Queria ver-me livre daquilo que estava aqui dentro, algures entre a memória e uma visão do futuro, mas que não saía. Que teimava em não sair. Há meses demais que não se transformava em palavras no papel. E as expectativas deixaram de o ser e já se tinham transformado em desilusões. escrever para o jornal, e ele em particular, tornara-se, entretanto, a minha única ajuda, depois desta íntima e comprovadamente arriscada decisão de viver exclusivamente do que escrevo. Arriscada. Não saiu mais nada desde o último livro. Um sucesso que ofuscou, quase novela ele próprio. Um mal de Montano inultrapassável e tantas vezes repetido na literatura. Um mal do vazio da página em branco que me fez transpirar e tremer com a caneta indecisa entre os dedos, e ele, depois dela ter partido, e com ela outras colaborações em revistas, era o último garante desta esperança do regresso da palavra. Não sei de alguma vez acreditou verdadeiramente que fosse possível recuperar deste mal. Acho que nunca acreditou. Ajudou-me por pena, só por pena. Pena. Do mal que me afligia. De Montano. Até esse se ultrapassou.
- E então?
Tive uma sensação de vertigem, como se as palavras presas se tivessem que soltar imediatamente. A pergunta foi brusca e desamparada demais para poder resistir a uma reacção mais intempestiva, que não era merecida. Tinha decidido manter a frieza. A distância possível para evitar a. e não queria transformar tudo em.
(Não hoje. Não depois de tudo!)

George Cassiel


(V) O escritor famoso também passou pelo Amor e Ócio

Ela abordou o escritor famoso, segura nos gestos, na postura, na voz.
- Vim aqui com o propósito de lhe pedir o favor de ler este original de que sou autora. A sua opinião é importante. Talvez decisiva.
O escritor famoso estendeu a mão para segurar o original, enquanto lhe perguntou pelo nome.
- Maria Helena.
- Pois até o leio, Maria Helena, se me disser porque escreve. Sorriu.
- Bem…porque gosto de escrever!- Não é suficiente. Hoje, toda a gente gosta de escrever! Quase aposto que tem um blog…Tem?
- Não. Não tenho, mas escrevo num.
- É a mesma coisa. Pertence ao grupo banal e eclético daqueles para quem não é suficiente dizer. Pois claro que se acabaram as tertúlias de café. Hoje já ninguém conversa, a oralidade está a perder-se. Toda a gente quer fixar as palavras no papel ou no ecrã. No silêncio de um suporte qualquer. A honra da palavra extingue-se. A palavra dita está rouca. A vulgaridade escreve-se. Deve achar que o que tem para dizer é tão importante que tem de o fixar, gravar em caracteres, se possível impressos. Já ninguém conta. Já ninguém diz. Ambiciona escrever um livro…
- Lê ou não lê o original?
- Dá-lhe prazer escrever?
- Sim, claro!
- Nada é claro para quem escreve, minha senhora! Provavelmente tem aqui um depósito de coisas claras que vão ofuscar o leitor....
-E o senhor começou ou não a escrever livros?
-Tenho, como sabe, dezenas e dezenas de livros publicados, tiragens fenomenais. Faço sessões de autógrafos. Pedem-me para ler originais. No entanto, não tenho um blog, nem escrevo para nenhum…- Dê cá o original! Nunca imaginei que…
- Não! Desculpe… Agora vou ler o seu original. Pediu-me que o lesse. Ou acha que numa conversa me dizia tudo o que tem aqui escrito?

Maria Heli


(IV) José, n' O Souselense

Figura sombria.
Alto. Magro. Escanzelado.
Bigode farto e tingido pelos fumos.
Longas melenas emolduram um rosto que se diria talhado a rudes golpes de enxó.
Um cigarro sempre aceso, “imagem de marca”, brinca numas mãos algo etéreas.
Caminha sempre exageradamente direito, com um fanático orgulho na erecção da sua coluna vertebral.
Calça de ganga. Camiseta vermelha. Polido sapato.
Olha, sempre, com um olhar distante e repleto de amargura.
O jornal e o maço de papéis. Sempre.
O lê-los, relê-los e anotá-los é tarefa sempre incompleta que repete, incessante e insana, todos os dias, sentado à mesa do café.
Embora raramente, faz publicar no jornal da terra as suas notas. Os seus poemas.
Pobre louco. Diz que é Escritor.

(Anda por aí, passeando nos blogues. Vi-o, primeiro, a descansar num banco de jardim, no Divas & Contrabaixos, recusando manuscritos e pensando que era famoso.)

Alfredo Caiano Silvestre

julho 13, 2005

Andará um escritor a passear de blog em blog?

O último "À escuta" inspirou George Cassiel ou então, é mesmo o escritor famoso - ou o seu espírito - que anda a vaguear de blog em blog. De cada vez que entra numa casa, deixa uma marca. Demasiada imaginação, excesso de pensamento mágico? Pois, mas agora o Escrita Solta também foi invadido!

(I) No Divas sabemos que conversa escutei.



(II) George Cassiel registou outra passagem:

Era um escritor famoso. Sentou-se no degrau da porta de casa. Respirou serenamente e devolveu o original ao vento.
- Agora sim, escrevi, verdadeiramente, uma obra de arte!
Passou a pertencer ao vento. Foi devolvido à natureza!



(III) No Escrita Solta, encarnou em Wilson T e empatizou com um aspirante a escritor famoso:

Bem.
Não se percebe bem porquê
(não eu claro
cujos raciocínios não ultrapassam uma simplicidade provinciana)
mas o indivíduo chegou lá a esse curral onde todos parecemos querer chegar
a fama
o dinheiro. E sei lá o que mais
talvez a puta da mania de querer mostrar qualquer coisa aos outros ou a nós próprios. Pois há tipos que chegam lá e não se percebe sequer porquê. Talvez
bem talvez pertençam a uma esquadrilha um grupo de malfeitores culturais uma merda qualquer. Porque queremos nós estar lá
pertencer a essa escumalha.
-- O vaidoso nem me leu aquela porcaria. Dá para acreditar
(O que me diverte é que era o original.) O único exemplar e o tinhoso pegou nele sentiu o peso do papel com paternalismo
olhou-me sorrindo e disse
-- Vou lê-lo mais tarde. Um dia. Um dia em que tenha tempo. Sabe
tenho muitas coisas de gente que está a começar. Mas deve continuar. Não perder a fé. Isto não é fácil. É preciso muito trabalho.
não dá. Não dá
muito obrigado.



(IV) ... se conhecerem outro blog por onde este escritor famoso ande a passear, pairar, quiça a aborrecer alguém, avisem por favor!

julho 12, 2005

Como começou... Um post

À Escuta

Era um escritor famoso. Quando alguém com ambições na escrita se aproximava com a intenção de lhe deixar um manuscrito para que o lesse e avaliasse, ele respondia: não, muito obrigado!

julho 02, 2005

Manual de Utilização deste blogue

Quem aqui quiser deixar o seu texto

em www.blogger.com/start

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password : efamoso

(e não se estraguem!)

julho 01, 2005

O Escritor Famoso

Iniciativa de Divas & Contrabaixos

O nascimento deste blog

... aconteceu no dia 28 de Julho.