11. (sem título), por Joaquim Pavão
Queimei-me! O dedo não arde, apenas dói. Volto a colocar o isqueiro no chão. Levanto-me? É isso! Estou a levantar-me. Tenho que agarrar-me. Tantos solavancos! Onde vou? Usa os olhos, usa os olhos. Só vejo manchas arrastadas em confusas direcções. Parei? Acho que parei, embora o corpo sinta ainda o passado no presente. Calmaria? Parece que parou. Olho e já estou na porta. Respirar, meu deus! Respirar? Inspiro, expiro, repetição. E mais repetição. Mão na maçaneta e rodo. Puxa, há que puxar e abriu. Respirar com repetição. Calma e um passo seguido de outro. Respiro entretanto. Parece-me bem, apreendido. Sorrio, parece um sorriso mas não o vejo. Será o vento ou tu que me fazes cócegas. Fecho os olhos. Escuro luminoso. Inspirar, expirar. Esqueço-me. Tosse. Inspira e expira. Calma. Repete. Sento-me num tronco. É o jardim? Viro-me e lá está a janela. Torno a virar e sei. É o jardim. Respira, repete. Arrepia-me de frio este calor. O dedo do pé mexe. Tenho-o que parar. Inspira, raios… Tosse. Respira, repete. Não posso distrair-me. Algo bate. Uma, duas, quatro. Parou. Tempo e mais tempo. Uma, quatro, cinco. Parou. Vem da porta. Rangeu e abriu. Ouvi claramente. Respira, repete. Passos. Um, dois, cinco, muitos. Volto-me. Está na janela! Vejo-o sem retribuição. Livro? Coloca-o na estante. Tira, coloca-o. Tira, coloca-o. Uma, duas, três, cinco… Tosse… Inspira, expira. Repete. Olho-o mais uma vez. Tenho retribuição. Desaparece da janela. Desapareceu. O meu dedo do pé mexe. Tenho-o que parar. A maçaneta está a rodar. Sinto frio por causa deste sol. Respira, repete. Aproxima-se. Já o vejo e ele retribui. Aponta o dedo? É feito de metal. Dedo estranho, dedo estranho. Nuvem, barulho. Estou molhado. Tenho ainda mais frio. Estou molhado e está sol. Deito água…. Tosse… Inspira, inspira… Tosse… Cuspo vermelho vivo… Tosse… Inspira… Inspira… Vou dormir agora. Bati com a cara? Mas é o buraco que me dói. Buraco? Inspira…
Diário de um Esquizofrénico
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