agosto 17, 2005

22. Maus pais, de Lino Centelha

Se procurarmos com a devida persistência, encontramos sempre uma relação causa-efeito entre dois acontecimentos separados no tempo mesmo que aparentemente não tenham nada a ver um com o outro. Encontrada essa relação é quase imediato deduzir uma fórmula matemática que descreve o fenómeno e a partir daí temos uma descrição que permite com toda a exactidão fazer previsões sobre o futuro das diversas entidades envolvidas.
As transformações de Lorentz permitem, já ao nível da relatividade restrita, justificar a dilatação do tempo quando se anda de baloiço. Talvez fosse um pouco exagerado passar meia hora para uma hora mas talvez eu não tivesse na altura a instrumentação adequada. Recordemos que éramos ainda crianças. E medir tempos com precisão é um assunto que envolve ainda hoje grandes polémicas entre os especialistas.
Quando eu disse à minha mãe que andava de baloiço com a Helena estava, evidentemente, a dizer a verdade. Embora eu tenha que reconhecer que ela não merecia. Foi muito penoso para mim terem chamado os meus pais à escola. A Helena também não gostou. Nunca se tinha falado num caso daqueles: pais chamados à escola por mau comportamento. Nunca se percebeu muito bem o que é que eles tinham feito de errado. A Helena achava que eram eles que tinham andado a rir-se e a atirar pedradas. O que para uns pais não fica nada bem. Mas eu acho que eles fizeram qualquer coisa mais grave. Talvez fossem actividades políticas ilícitas. O meu pai não era do Benfica e isso dava sempre problemas.
Depois disso a Helena deixou de ir à escola e eu passei a ter mais tempo para a matemática.

Lino Centelha