agosto 03, 2005

14. O Baloiço do Parque, de Alfredo Caiano Silvestre




(...) Depois os que riam passaram a chamar-nos namorados. Às vezes atiravam-nos uma pedra que nunca acertava e fugiam. Começámos a sair da escola durante o intervalo grande, que era de trinta minutos, acho eu, e desfrutávamos o facto de àquela hora o baloiço do parque estar sempre livre. Às vezes a meia hora passava a uma, ou mais, até que a professora chamou os nossos pais por mau comportamento. O que é que eu andava a fazer com a Helena, perguntou-me a minha mãe à noite. Andamos de baloiço, respondi. (...)

Era a mais pura das verdades!
Apenas andávamos de baloiço, rindo, gargalhando, felizes.
Uma felicidade imensa.
Chegou o Verão e partiu a Helena.

Nunca mais a vi.

Nos meus textos jaz a memória desses dias.

Ocupa-me todo o tempo. Tento passar para o papel cada emoção, cada sorriso, cada alegria, cada gargalhada. Fixo, nestes papéis que comigo carrego todos os dias, a alegria desses dias.

Escrevo-me, escondido de mim.
Chegam-me ecos longínquos de uma fama que recuso. Eu, José, quero mais este café da minha aldeia. Este convívio com esta gente simples para quem sou “o poeta”, um pouco louco. O estar nestes lugares que me trazem a Helena todos os dias.

Ele, o outro, o famoso, dizem que vive retirado.



Querido José
Escrevo-te esta carta que nunca receberás.
Os meus pais

Alfredo Caiano Silvestre
O Souselense